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Cartunista foi um dos fundadores do jornal O Pasquim
Por Bruno de Freitas Moura - Repórter da Agência Brasil        | Edição: Marcelo Brandão
      Antes de ser conhecido como o pai do Menino Maluquinho e ícone        da literatura infanto-juvenil, o cartunista Ziraldo, falecido no        sábado (6), aos 91 anos, teve atuação marcante como jornalista em        defesa de democracia. Durante a ditadura militar, usou seus traços        para combater o regime autoritário e defender a liberdade de        expressão.
      O corpo do desenhista foi velado neste domingo, 7 de abril,        data que marca o Dia do Jornalista. O velório foi no Museu de Arte        Moderna do Rio de Janeiro, cidade onde o mineiro de Caratinga        morreu de causas naturais.
      A Agência Brasil conversou com amigos, ex-colegas de profissão        e familiares, que ressaltaram a atuação de Ziraldo nos anos de        repressão e censura.
      O Pasquim
      A maior representação de Ziraldo nesse ofício está no jornal O        Pasquim, que teve o desenhista entre seus fundadores e principais        colaboradores. Ao seu lado, nomes como Jaguar, Sérgio Cabral e        Tarso de Castro.
      O veículo de imprensa circulou nas décadas de 70 e 80 e era uma        das resistências à ditadura, tendo enfrentado censura, perseguição        e rendido aos seus responsáveis prisões durante o regime de        exceção.
      "Era o deboche, a piada, a gozação para afetar o regime        ditatorial na base do deboche", lembra o jornalista Marcelo Auler,        hoje conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e que        compartilhou a redação de O Pasquim com Ziraldo a partir de 1974.
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| Um capricho do destino fez com que Ziraldo fosse sepultado no Dia do Jornalista. Foto - Tânia Rêgo/Agência Brasil | 
"É um outro tipo de jornalismo, muito crítico e sempre de        oposição", classifica. Ele conta que, apesar de repórteres fazerem        entrevistas que duravam várias horas, os textos mais longos não        eram a característica principal da publicação.
      "O Pasquim era um jornal de piada, de cartum, desenhos. O        [cartunista] Henfil, com o seu [personagem] Fradim, atingia muito        mais que muito texto de jornalismo. O Ziraldo, com suas charges,        atingia muito mais que muito texto de vários jornalistas".
      Contra a censura
      O ex-deputado federal e ex-ministro das Comunicações Miro        Teixeira acrescentou que, por meio do tabloide, Ziraldo e a equipe        conseguiram fazer chegar à população as violações que estavam        sendo acobertadas pela censura de Estado.
      "O Pasquim era censurado também, mas conseguia atravessar com a        arte algumas brechas deixadas pela ditadura. Foi útil para levar        ao povo o conhecimento do que se passava nos cárceres, porque as        pessoas não tinham conhecimento, a classe média não tinha        conhecimento. Foi graças a pessoas como o Ziraldo que isso chegou        ao conhecimento da população", conta Miro, que também é        jornalista.
      O cartunista Ricardo Aroeira aponta legado de Ziraldo em toda a        imprensa brasileira. "Como jornalista, ele abriu três, quatro,        seis projetos diferentes que, na verdade, mudaram a linguagem        jornalística. Nenhum jornal brasileiro é o mesmo depois de O        Pasquim. O texto do jornal é diferente, a abordagem da reportagem,        um certo senso de humor e leveza, isso tudo é Ziraldo", diz.
      Família
      Irmão mais novo do cartunista, o designer gráfico Gê Pinto        lembrou de um momento difícil da trajetória de Ziraldo, a prisão        durante a ditadura. Um dos prováveis motivos foi a participação em        O Pasquim. "Eu estava na casa dele no dia em que ele foi preso.        Ainda menino, levei um susto danado", rememora.
      "O Ziraldo sempre teve esse compromisso com a liberdade e com a        democracia. A gente sentia em cada gesto dele, em cada atitude e        nas charges. Foi um orgulho ver como ele foi resistência", afirma.
      Para a cineasta Fabrizia Pinto, filha de Ziraldo, o pai salvou        o Brasil do regime militar e enfatizou que Ziraldo não deixou o        país no período mais difícil para a imprensa e a sociedade. "Ele        ficou no Brasil para lutar contra a ditadura. Ele lutou com a        pena, um papel, ideias pequenas e pérolas. Uma pessoa como essa        nunca vai se esvair, não vai embora".
      A diretora do Instituto Ziraldo, Adriana Lins, que também é        sobrinha do desenhista, enumera fatores que, na visão dela,        forjaram Ziraldo como jornalista.
      "Ele é um crítico de costumes, um crítico político, um        observador curioso desde o dia em que nasceu. Na hora em que você        tem todos esses dons, essa sagacidade, essa curiosidade, essa        inteligência, acaba virando jornalista", afirma.
      "Ele fez todo mundo saber de tudo de uma maneira tão sagaz,        minimalista, em épocas que não podia se falar tudo às claras",        ressalta a sobrinha. O Instituto Ziraldo é uma instituição que        preserva o trabalho intelectual do artista.
      Jornais e revistas
      Ziraldo frequentava redações antes do começo da ditadura        militar, iniciada por um golpe que completou 60 anos em 2024. Em        1954, começou uma página de humor no jornal A Folha de Minas.        Passou também pelo semanário O Cruzeiro - que tinha enorme        circulação nacional - e pelo Jornal do Brasil. O mineiro também        trabalhou na revista Pif-Paf, dirigida por Millôr Fernandes.
      Após a redemocratização, Ziraldo acreditou em mais projetos        editorais, como as revistas Palavra e Bundas, as duas em 1999. A        segunda ridicularizava o culto a celebridades. Em 2002 lançou O        Pasquim 21. Era uma tentativa de reviver os tempos áureos do        tabloide de oposição. Mas a iniciativa durou apenas até 2004.
      Estátua
      O compositor Antônio Pinto, um dos filhos do desenhista,        adiantou que existe o objetivo de criar no Rio de Janeiro um        centro cultural em homenagem a Ziraldo.
      "Meu pai é uma figura enorme, um cara que criou por mais de 70        anos para o Brasil. A gente tem na nossa casa, onde era o estúdio        dele, um material vastíssimo, mais de mil desenhos. A gente quer,        de alguma maneira, colocar isso para as pessoas verem".
      Outra forma de legado é um desejo antigo da filha Fabrizia        Pinto e que mudaria a paisagem do Rio de Janeiro. Uma estátua na        orla da praia de Copacabana, onde já há uma homenagem a outro        mineiro, o poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).
      "Eu gostaria muito que ele ficasse sentadinho do lado dele,        Drummond e meu pai, porque eles se amavam muito, eles eram muito        amigos", pediu emocionada.
      "Nós é que pedimos. Então vamos fazer todas as homenagens que        ele merece e não são poucas", respondeu o prefeito do Rio de        Janeiro, Eduardo Paes.
    
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